Sigur Rós – Ágætis Byrjun

Ao segundo álbum, os Sigur Rós afastam-se dos ambientes soturnos de Von (1997) e partem para um lugar menos experimental do que aquele em que encontramos o álbum de estreia. É impossível pensar em Ágætis Byrjun (1999) sem o relacionarmos com a insularidade dos membros da banda. Afinal, será que o aparente isolamento geográfico de uma ilha europeia no Oceano Atlântico que está mais perto da gelada Gronelândia do que da Irlanda e da Grã-Bretanha pesa no produto musical que se vê nascer por lá? É certo que lhe dá uma certa carga de misticismo – possivelmente auto-sugerida por quem ouve – e um cariz excêntrico. Björk pode ter aberto os nossos ouvidos à música proveniente de um pequeno pedaço de terra que tem vindo a crescer com o afastamento das placas europeia e americana. Os Sigur Rós dispõem-se a fazer algo mais.

As guitarras continuam graves e cheias de distorções, mas a voz estranha de Jónsi Birgisson destaca-se mais. Com uma mão cheia de temas épicos – dois dos quais com duração superior a dez minutos – Ágætis Byrjun enche-nos de um pós-rock cheio de influências electrónicas e clássicas que nos dão momentos como “Hjartað Hamast (Bamm Bamm Bamm)” e “Viðrar Vel Til Loftárása”.

Mas é nas melodias que o talento do quarteto islandês se mostra irredutível. Merecem destaque “Starálfur”, belíssimo tema que vive de pequenos e eloquentes detalhes e “Flugufrelsarinn”, ora grave e lúgubre, ora luminosa e viva para além da terra e dos ossos, uma das melhores faixas de Ágætis Byrjun.

Temperado por uma enorme vontade de dar à música pop mais e diferentes roupas, os Sigur Rós propõem mais do que uma alternativa. Ágætis Byrjun é já um álbum seminal: pelas imensas portas que abre, pelo distanciamento de tudo o resto e pelas subtis diferenças internas que fazem dele um álbum complexo, com texturas diferentes a cada canção, mas, ainda assim, estranhamente lógico, homogéneo e belo.

“Ný Batterí” é um bom exemplo da boa nova trazida pelo quarteto islandês, com o seu início nocturno e pantanoso de instrumentos de sopro em desarmonia decrescente que acaba por se tornar numa música de estrutura simples e texturas complexas. Este é o jogo dos Sigur Rós por excelência em Ágætis Byrjun.

Já “Ágætis Byrjun”, a canção, agarra-nos por ser bonita e simples sem refúgios nem desculpas. Nesse sentido, é o tema mais cru (o que, quando se fala de Sigur Rós, quase não faz sentido) e sincero do álbum. É aquele pequeno sorriso final.

“Avalon” fecha o álbum num ambiente enevoado e sombrio, trazendo à memória alguns temas compostos por Angelo Badalamenti para a banda sonora de Twin Peaks, a série de culto norte-americana realizada por David Lynch. Não é o final que se espera, mas é definitivamente o mais adequado: desconjuntado, decadente… fim de uma boa memória.

9/10 | Filipe Marques

~ por hiddentrack.net em 12, Novembro, 2005.